domingo, 1 de maio de 2011

Onírico


Sonhei com muita freqüência nas ultimas semanas. Meu leito se tornou uma verdadeira incubadora criativa. Sonhei com a edificação de vontades antigas que, hoje, já não fazem sentido. Sonhei com sinfônicas fantasias que terminavam com a desafinação dum cravo estraga-prazeres: o sol da manhã. Sonhei com os “any” sonhos e desejos que cultivo quando estou desperto. Sonhei, e, atordoado pelo fluxo abundante de sonhos, dei corda a minha imaginação. Pensei, a priori, nos significados científicos que um sonho pode carregar.

A psicanálise, hoje em dia, explica - ou, pelo menos, se esforça para explicar - quase tudo. Freud dizia que o conteúdo onírico é capaz de revelar desejos íntimos e traumas escondidos; que o sonho é a mais cristalina forma de expressão do subconsciente. Conclui que o meu subconsciente deve ter muito o que dizer, mas ok, disso eu já tinha uma idéia e, além do mais, percebi que não era exatamente sobre isso que queria saber. Percebi que o que me interessava mais era o significado místico dos sonhos. Lembrei de uma cigana que, quando era pequeno, visitava com frequência a casa de uma tia. Falava sobre destino, fortuna, linhas na mão, torot e, por fim, sonhos. Como eu ficava seduzido por aquele assunto! Passava a tarde sentado em meio ao tapete amarelo da sala a ouvir aquelas estórias e verdades que desvendavam e alimentavam todos os mistérios que uma criança de oito anos podia se interessar. Falava que sonhar com a visita de cavalos brancos era morte de um ente querido, e, por isso, passei a dormir com os olhos apertados na expectativa de nunca sonhar com cavalos que, por um acaso do destino, viessem em sua alvura buscar a alvura da alma de alguém que eu amasse. Falava também que sonhar com bosta significava dinheiro, e, então, ia eu dormir ansioso por um sonho farto de excretas. Enfim, buscava em cada noite desvendar por mim mesmo aqueles significados ciganos.

Na busca por minhas curiosidades, procurei, na internet, por crenças, misticismos, sonhos e seus significados e, é claro, que encontrei muitas coisas contraditórias e diversos significados diferentes para o que venho sonhando, além de nada possuir a profundidade da qual procurava. Me frustrei com o fracasso de minhas pesquisas e, com a frustração, preferi manter o néctar das idéias formadas na infância e parei, por alí, com aquele início de obsessão. Até que, semana passada, em outra casa, porém a casa daquela mesma tia, resurgiu o assunto de sonhos. A minha tia é espírita ao modo dela e, em sua crença, ela mistura concepções das mais diversas sem o menor prejuízo de sua fé. Conversar com ela é como se esquecer de todos os academicismos, cientificismos e ceticismos que nos acompanham. Por aqueles momentos de prosa incorporei toda a sorte de superstições e me deixei levar pelo o fascínio de suas verdades. Veio ela me dizer que sonhar é entrar em contato com os outros planos da realidade que a nossa alma tem acesso. Às vezes, quando sonhamos, não estamos apenas imaginando, mas estamos de fato em contato com outros mundos. “Mas tia, como distinguimos a imaginação disso que você falou?”. "Na verdade nós, espíritos de ainda-pouca-luz, não podemos distinguir isso, mas, a medida que evoluímos e entramos em maior contato com a nossa espiritualidade, o nosso poder de distinção e até de controle aumenta."

Caí num devaneio profundo sobre a possibilidade de, ao dormir, viajar por outras vidas, mundos, planos e dimensões. A possibilidade de um amor que não deu certo por aqui ter sido bem sucedido em outra realidade. De ser físico, médico ou esportista em outras versões de mim. Ou, então, de conhecer pessoas célebres ou de ser célebre eu mesmo. Tudo isso me fascinou e eu não parei de pensar desde então. Assim, como quando criança, me pus a dormir, de olhos bem apertados, a espera de viver essas outras vidas, pouco me importando se são ou não meras ilusões. Quis viver tudo aquilo que não sou capaz de viver em minha limitada realidade. Descobri que sonhar é um júbilo especial do qual nunca havia dado atenção, e que acordar é a mais decepcionte das sensações. Entendi que o sonho é a subversão virtual do fardo, que ilude até desiludir com a tomada da consciência. A dicotomia do sonho angustia, todavia é o preço para vivermos as nossas fantasias mais impossíveis.


Eder de A. Benevides

Um comentário:

  1. Olá Eder,
    Decididamente, estou rendida às suas palavras.
    Vou seguir o seu blog. Se entender fazer o mesmo, em relação ao meu, ficar-lhe-ei grata.
    Abraços com luz.

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