sábado, 24 de março de 2012

Montreal

Montreal

Foi a neve mais bonita que já vi. Os flocos dançavam e rodopiavam entre a iluminação dos postes, cintilavam como poeira mágica e caíam serenos no chão alvo e gelado da René Levesque. Esperava no ponto o ônibus para o aeroporto. Foi naquela madrugada que retornei ao Brasil e deixei aquele mundo tão diferente que era Montreal. Era inverno e meus dias estavam escuros e tediosos naquela cidade. Parecia que toda a melancolia acumulada durante o ano se manifestava de forma opressora naquela estação. Alguns sinais de alegria rompiam o breu e a indiferença desses tempos frios: o balé delicado do gelo é um exemplo agradável.

O Brasil é maravilhoso com todo o seu sol e esplendor. Clamava pela beleza e magia tupiniquim sem reparar na beleza implícida que existe em qualquer outro lugar habitado. O norte gelado também tem o seu brilho , a sua poesia. E como todo bom poema, Montreal me deixou sua marca. Imprimiu no meu cerne a capacidade de ver a mínima reverberação até no escuro do inverno. O povo quebecois ( como são chamados os habitantes da província de Quebec) é de uma gentileza e educação adimiráveis. São em raros lugares que é possível entrar em um ônibus e se deparar com um motorista que dá bom dia para todos os passageiros. Respeitam filas, respeitam as diferenças e, apesar de individualistas, são generosos com quem necessita de ajuda. Penso, que no fundo, me identifico um pouco com os quebecois.

Sempre me considerei muito brasileiro - e ainda me considero, entretanto, acho que a essência dos lugares por onde passamos se anexa a nossos âmagos. Às vezes me sinto um tanto quebecois por essas terras tupiniquins, mas não é às vezes, acho que me tornei um pouco como eles, afinal. Trouxe um pouco da auto-suficiência, da franqueza e da melancolia daquelas pessoas. Não digo melancolia como algo degradante, mas como algo importante da essência humana. Temos que conviver com a melancolia para dar valor à felicidade, para conhecer aquilo que realmente nos faz bem e nos traz paz e serenidade. Ando sem paciência para as leviandades e palavras vazias, que nós, brasileiros, nos servimos excessivamente. Ando farto daqueles que furam fila sem qualquer sinal de respeito pelo outro, das notícias de corrupção no congresso nacional, do jeitinho brasileiro... E pior, ando farto daqueles que não honram as suas declarações e seus sentimentos. O número desses me supreendeu.

Não obstante, estou feliz por voltar ao país dos sorrisos gratuitos, da pessoalidade e do calor humano. Estou feliz por voltar a ver meus sinceros amigos, a minha linda Vitória e toda a carga histórica que ela possui para mim. Estou feliz de voltar ao meu curso que, apesar de pesado e tão sério, é o que puxa os meus pés para o chão e me vai garantir o sustento futuro. E a verdade é que eu nunca esquecerei aquela última neve, que me remete a tantas lembranças, pessoas e acontecimentos. Montréal, jamais je ne t'oublierai.

Eder de A. Benevides