segunda-feira, 25 de abril de 2011

Baby

Então baby, a sua ressaca não passará. Não tenha o trabalho de se levantar. Arraste-se mesmo para sarjeta da qual pertence, com os vícios dos quais se acostumou; com os gostos de vômito e excretas dos quais está habituada. Cansei do fio circunscrito que representa a sua sanidade. Baby, perdi o sorriso, perdi o olhar, perdi o toque, perdi o tesão, perdi a loucura. Agora me resta o vinho oxidado e denso da sua influência.

Se pensa que ainda te amo, sugiro que não me instigue. Que não me teste com as suas peripécias e seu hálito de predadora. Não sou mais um camundongo indefeso. Não sou mais um pênis em que possa cavalgar em dias de solidão sufocante. Tornei-me hermético para os seus botes venenosos. Você quis abusar do adultério e me envolver em suas orgias pútridas, mas esquecera que o meu corpo não é feito do mesmo barro que o seu; que não me afeiçôo por vaginas sem rostos e por mamilos randômicos.

Ai, como me arrependo de ter me deixado envolver. Conhecera-a com um vestido lunar e com o ímpeto no cheiro. Tornei-me o ímpeto e todo o resto. Para mim, um toque nunca fora uma miscelânea de profusões epidérmicas, cardíacas e alucinógenas. Antes de você, baby, o toque era apenas o usual meio para o gozo e esquecimento.

Vivi, contigo, o gozo pelo gozo. Ainda sinto o seu salto alto em meu peito. Escuto de novo a súplica por mais. E como você quis mais! Não se saciou. Adentrou as casas noturnas dos ébrios e insaciáveis em busca de prazer. Amiúde, foi consumida pela total falta de limites. Baby, fui consumido por sua total falta de limites. Compartilhei os lençóis úmidos das madrugadas púrpuras ao seu lado. A assisti no frenesi lascivo com outros homens, senti néctares que não eram seus em meus dedos. Perdemos o controle. Não, você perdeu o controle! Fui rendido, sem direito a reagir, pelos seus jogos.

Aquilo não fazia parte de meu ímpeto, alias, havia perdido o meu próprio ímpeto. Fiz parte dos seus caprichos e fetiches por muito tempo, até que numa alvorada, após uma insônia de frivolidades, acordei para mim. Estava viciado em sua sordidez e a cada dia estava mais embriagado. Tentei nos tirar daquele lugar quotidiano, todavia você não quis sair dalí. Percebeu meu movimento de fuga e, como uma viúva negra, tentou me devorar. Devorar o macho e o incorporar a si definitivamente.

Implora para que eu volte, mas para que? Para que me quer se o seu prazer é não me querer? Alias, me querer ali como observador do seu querer por outros quereres. Diz que me ama com as mãos desesperadas por debaixo de minhas calças, ansiosa por sentir meu gosto, porém à milhas de sentir a minha alma. Hoje posso enxergar a sua alma diafanamente, sem enganos, truques e ilusões de ótica. Você se tornou muito óbvia para mim. Baby, será que um dia poderá enxergar o meu âmago? Desculpe, mas acho que nunca.

Baby, não há mais volta. Os caminhos que seguiu são irreversíveis. Esse mundo faz parte de você. Esse mundo é você. Volte para a sua orgia e me esqueça. Se, pelo destino, me encontrar pela rua, esconda de mim os seus sapatos de salto alto. Quebre-os, tire-os, desfaça-se deles no mesmo instante, porque não quero mais me lembrar da pressão de seu corpo sobre o meu peito; das cicatrizes indeléveis que o seu tesão deixou. Não serei capaz de te esquecer jamais, mas, também, não preciso me lembrar que sempre estive sob os seus pés.

Eder de A. Benevides

2 comentários:

  1. Forte. Fortíssimo. Mas bem feito, confesso.
    O tom de revolta, ódio, traz uma certa aproximação com a escrita que não é ruim, mas que pede, talvez, um certo controle.
    No mais, parabéns! Seus últimos textos estão muito bons!

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  2. minha nossa.

    "ansiosa por sentir meu gosto, porém à milhas de sentir a minha alma"

    Esse texto está como a viúva-negra que nele mencionas... devorando quem lê e incorporando.

    muito bom velhinho!

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