terça-feira, 6 de setembro de 2022

Se Conhecer

 Nem todo mundo conhece a si mesmo. Não tento ser extra hermético e erudito. “Conhece a ti mesmo” tem sido praticado por mim no próprio tecido da vida. Em uma madrugada insone após a outra. Socrates, Nietzsche, e algum outro alemão ou russo, contribuíram pouco para esse processo. Contribuíram muito mais, quando mais moço, para inflar o ego e ter repertório em mesa de bar. Hoje, busco as minhas respostas em meu próprio microcosmo. Esmiúço cada mecanismo do meu ser à exaustão. Descobri, nessa empreitada, a obsessão. Sou constituído, basicamente, de sonhos e obsessões. Não me leve a mal, não sou maluco, apesar de todos sermos. Sou persistente, observo cada trejeito de cada situação e revisito minhas conclusões muitas, muitas e muitas vezes. Meu humor sempre foi uma tormenta. Vario dezenas de vezes em um mesmo dia. Amo, odeio e amo de novo, mas jamais sou indiferente. Nunca consegui ser indiferente e, por isso, sempre caí em provocações, sempre tomei lados e, na prepotência de achar ter razão, perdi muito mais do que ganhei. Confesso que esse meu jeito faz de mim um homem constantemente exausto. Eu me canso de mim mesmo e, em muitos momentos, não me aguento. Não obstante a tudo isso, afirmo que os dias se tornaram mais e mais agradáveis a medida que me tornei mais íntimo de mim. Se ainda me reservo alguma autoridade a dar conselhos, digo que jamais encontrei autoconhecimento em livros de filosofia ou autoajuda. Encontrei-o, na verdade, na imersão em mim mesmo, na iniciativa corajosa de admitir cada traço de personalidade, virtuoso ou roto. Está no desapego da coerência e no despertar da intuição. Não somos coerentes, somos primordialmente, axiomaticamente, incoerentes. E foi nessa incoerência que me encontrei. Percebi, nas longas conversas travadas junto ao meu âmago, que a alma é selvagem e dona de si própria. Corre como um lobo que atravessa as planícies sob o luar. Indomesticável, padeci iludido sob a falácia do controle pleno. Entender isso é alinhar os chakras e correr junto ao fluxo do universo. Paradoxalmente, ganha-se algum controle sobre a vida quando deixa-se de querer ter total controle sobre si mesmo. Por isso, tenho escolhido, decidido, trabalhado e caminhado junto a mim, em desarmoniosa harmonia. Não sou apenas razão, mas também carne, estômago, sexo e intuição. Afeto e desafeto. Derrotado e obstinado. Nesse passo, cochicho em meu próprio ouvido, me persuadindo ou dissuadindo de meus vários anseios e obsessões. E, quando a noite cai e a insônia bate a porta – uma velha amiga, sento na chão de minha varanda, olho para as estrelas e, como marinheiro, busco nelas e em mim o meu norte.

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