domingo, 21 de março de 2010

Enfim

Ele queria aquele beijo, queria que os seus lábios tocassem o dela finalmente. Olhava-a incessantemente, mas não tinha coragem de colocar a mão em seu rosto e conduzi-la ao derradeiro ato. A sua angústia era análoga a dos melancólicos poetas românticos: tudo não passava de sofridos desejos; as ações ficavam para folha de papel e, algumas vezes, para as noites solitárias e insones em sua triste cama. Já prometera a si mesmo que o tão esperado beijo não passaria daquele encontro, e que as suas fantasias ou se realizariam em toda a plenitude naquela madrugada, ou nunca viriam a se tornar reais.

Foi num barzinho sábado a noite que seus ímpetos internos vieram à tona. Suas vontades e pretensões gritavam por satisfação, assim como seus medos o corroíam as fibras cardíacas. A possibilidade da rejeição o apavorava mais que qualquer pantera que pudesse sair das sombras de seus pesadelos. O seu amor, virgem e latente, o privava de seu ego e natureza masculina. Poderia conquistar qualquer mulher, menos ela. Frente a esse sentimento ele não passava de um tímido garoto.

Sentou-se ao lado dela, respirou fundo e encarou-a com os olhos brilhantes que a vontade o estampara na cara. Conversaram sobre vários assuntos, riram juntos e trocaram alguns olhares. Por um momento olharam-se tão profundamente que o tempo parou. Nenhum dos dois pode respirar, nem sequer escutar toda a algazarra em volta. Ouviam apenas o frenesi que tomava-os o peito. Ele sabia o que estava sentindo, todavia milhares de dúvidas o tomavam quanto à recíproca. O seu ego, tão pisoteado por todo aquele platonismo, não o permitia acreditar plenamente que ela passava pelo mesmo. Pensava que aqueles momentos atemporais faziam parte apenas de seu imaginário, e que jamais o desejo que ele deveras sentia era compartilhado com aquela linda criatura. Idiota! Por isso digo que todo apaixonado é imbecil. Deixam de viver o amor para viver a incerteza e angústia; deixam de chegar às nuvens por medo de avião. Às vezes penso que a paixão é uma irônica e sádica puta.

Por vários momentos arriscou uma investida que não saía de seu imaginário. Às vezes alguns atos se exteriorizavam, porém a hesitação os corrompia antes de chegar à destinatária. Tentou uma ou duas vezes colocar as mãos em seu rosto e massagear seus cabelos, mas sempre aquele medo o levava a hesitar. Por um momento convenceu-se de sua covardia e decidiu desistir, mas foi só olhar para aqueles olhos novamente que aquela tímida e quase inexistente coragem voltava a irradiar em seu coração. Decidiu, então, apelar; Pediu uma dose de tequila e colocou todas as suas esperanças na crença de que seria aquela o seu cálice de coragem e atitude. A bebida chegou e numa golada só ele esvaziou o copo. Sentiu o seu corpo esquentar e seus ímpetos se agitarem em seu âmago. Foi então que a puxou para fora da mesa. Levou-a para um canto do bar. Sua mão enfim chegou àqueles cabelos e, com inefável prazer, ele os massageou como há muito tempo sonhava. Falou baixinho algumas palavras doces no ouvido, afastou-se e a olhou fixamente. Ela, com ternura, colocou as mãos sobre as dele, que estavam em sua cabeça, sorriu e fechou os olhos. Como num filme ele a beijou.


Eder de A. Benevides

Um comentário:

  1. Espero q essa seja o desenrolar do "Desabafo de madrugada", eqto ia lendo me senti como um mentor seguindo cada reação sua, felizmente o final foi diferente do q as eternas vítimas do platonismo costumam ter...sehr gut, mein freund! (Junim)

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