terça-feira, 2 de março de 2010

Desabafo da madrugada

Pela primeira vez em três anos me apaixonei. Sou, agora, mais um daqueles pobres homens que, derrubados na sarjeta, insistem em chorar as mágoas de um amor platônico ou duramente frustrado. O pior é que a razão de toda minha lástima simplesmente não faz sentido: caí em desespero por alguém quem não dá a mínima para mim, e que, além disso, sustenta um pilar de frieza e indiferença em relação a minha pessoa. Para se ter idéia, no final do ano que passou, vivi um período de instigante luta no movimento estudantil ao lado dessa pessoa. Acreditei, inocentemente, que havia conquistado determinada intimidade e simpatia dessa esfinge ambulante, porém, para o meu caos interior, me enganei. Conversávamos sentados numa mesa do barzinho do DCE, era o meu último dia de estadia em Viçosa antes do recesso. A felicidade de estar simplesmente ao lado daqueles olhos conversando banalidades do quotidiano era o suficiente para que brilhantes sorrisos pulassem de minha face. Mas o que me apunhalou foi a derradeira despedida: um gelado aperto de mão e um olhar evasivo foi tudo o que recebi.

Passaram-se as férias em Vitória; conheci pessoas incríveis, vivi situações inusitadas e, como há muito tempo almejava, li muitos romances. Meu recesso foi satisfatoriamente aproveitado. As primeiras semanas de pensamentos intensos e nostalgias idealizadas não tardaram a dar lugar a devaneios positivos. Com os seus méritos, os papos em mesas de bar e as orgias frívolas, que só a boemia dos poetas pode oferecer, ajudaram a apagar aquela presença quase indelével de meus pensamentos. Pensei que aquele sentimento estava morto e enterrado. Não lembrava mais daquelas características que me deixavam noites e noites aprisionado na armadilha das madrugadas fantasiosas. Não pensava mais no jeito qual fuma, com as pernas cruzadas e o queixo levemente inclinado para cima. Nem sequer lembrava a forma de falar, andar, olhar... O erro foi pensar que o existente em meu âmago também morrera: o que na realidade ocorreu foi o conveniente afastamento das distrações.

Final de semana passado, depois de três meses sem nenhum tipo de contado, vi a pessoa novamente. Foi um choque, surto e acesso histérico. As reações químicas que ocorriam em meu cérebro deixaram-me assustadoramente desequilibrado; não havia me esquecido, sequer enfraquecido aquele mordaz sentimento. Corri para o lugar mais ermo possível, não queria de forma alguma qualquer tipo de contato. Fiquei isolado em meu frenesi por quase uma hora e, então, voltei ao ambiente social em que estava. Um amigo veio conversar comigo sobre um conto que eu escrevera. Pobre coitado; abri a boca e disparei a falar. O pior foi que eu não falava coisa com coisa; o meu estado ébrio só me permitia comunicar-me da forma mais desconexa possível. Logo o desafortunado deu um jeito de escapar daquele meu momento de loucura e me deixou sozinho na explosão de devaneios e sentimentos que duelavam em meu âmago.

O contato direto com a pessoa foi inevitável, conversamos coisas bestas e sem importância por puro formalismo. Conclui que o pilar boreal ainda está de pé, e, por mais doloroso que seja, o que eu sentia ainda sinto. Talvez haja uma sórdida incompatibilidade aí, e, como é de praxe, eu esteja nutrindo algo inútil e infrutífero. Mas algo, que não consigo identificar, não me permite desistir. Hoje imaginei mil modos de me aproximar e, talvez, alcançar os meus objetivos amorosos. O coração sempre articula modos inexplicáveis para manter os homens na fossa e a sarjeta cheia.





Eder de A. Benevides

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